segunda-feira, 20 de maio de 2013

O mundo é um moinho


Ainda é cedo, amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Preste atenção, querida
Embora eu saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és

Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho
Vai reduzir as ilusões a pó

Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com teus pés

Reza a lenda que esta música foi composta pelo mestre Cartola quando sua enteada, ainda adolescente, filha de Dona Zica, decidiu abandonar o lar e começar a se prostituir. Não existem estudos que confirmem a veracidade de tal história, muito pelo contrário, estudos dizem que, de fato, não se passa de uma lenda
Muitos de nós que ouvimos tal conto o presumimos verdadeiro, pela coerência que existe entre a letra da música e a representação que costumeiramente fazemos da prostituição. Digo isto porque eu mesma, há cerca de 3 anos, ouvi tal versão e não me preocupei em confirmá-la, havendo reproduzido o mal entendido algumas vezes em rodas de amigos.

Semana passada ouvi a seguinte notícia na CBN: "Prostitutas de Belo Horizonte recebem aulas gratuitas de inglês e espanhol para recepcionar os turistas na Copa.". Tal anúncio me causou um grande desconforto, fazendo com que eu, mais tarde, analisasse minha reação.

Imaginem vocês que eu recebesse uma pequena paciente de 8 anos, filha de uma prostituta, mãe solteira... como eu poderia ajudá-la a lidar com seus problemas de auto estima caso considerasse sua mãe, a figura de referência mais importante de sua vida, uma espécie de criminosa ou um ser sem princípios éticos e morais? Eu muito dificilmente conseguiria este feito sem incorrer no afastamento afetivo de mãe e filha (o que não é uma opção, já que ela é uma mãe carinhosa e dedicada).
Foi a esta situação que a notícia me remeteu. A conclusão de que eu não conseguiria ajudar a criança foi inevitavelmente dilacerante pra mim... eu percebi que não tinha respeito pelas pessoas que exercem esta atividade e que tal atitude frente às prostitutas era de fato baseada em estereótipos e preconceitos, provavelmente compartilhados por muitos de vocês.

O que eu consegui levantar enquanto argumentos contra a atividade das prostitutas (excetuando-se aqueles de viés religioso):
1) Fazer sexo não é profissão, ninguém estuda pra isso;
2) Todos tem vocação (instinto) sexual... se sexo virar trabalho, todo mundo vai virar puta, porque né...;
3) Torna a traição algo muito fácil: To infeliz no casamento, vou na esquina, pago uma puta/um puto e pronto, meus problemas estão resolvidos;
4) O fato de existir uma profissional do sexo causa uma puta insegurança nas demais mulheres;
5) A família dessas pessoas deve sofrer muito com essa escolha profissional;
6) _________________________ (sinta-se livre pra adicionar quantos argumentos quiser).

Como eu derrubei esses argumentos:
1) Ninguém estuda pra ser jogador futebol, mas eu acho lindo quando eles resolvem estudar alguma língua... sou assinante do PFC, não perco um "Loucos por Futebol" na ESPN, comprei minha blusa Adidas do Mengão na pré venda e, exatamente graças a pessoas como eu, esses semi analfabetos faturam mais que qualquer prostituta de luxo;
2) Instinto sexual todos temos, FATÃO. Entretanto, depender de sexo pra ganhar o pão de cada dia não é moleza não... imagine que você sempre teve a oportunidade de refletir sobre inovações a serem implementadas na cama e as discutiu com seu/sua namorado(a), sempre pôde selecionar o que gosta e o que não gosta... puta, excetuando-se as excepcionalmente lindas e sedutoras, não pode se dar ao luxo de escolher muito os clientes ou as práticas adotadas na cama. Você se sente mal em ser tratada como objeto? A puta tem que encarar essa realidade de peito aberto e se submeter a... Estudo, seu lindo, eu te amo!;
3) Traição é fácil, com ou sem puta. Se seu relacionamento tem problemas, trate de tentar consertá-los;
4) Existem Sex Shops, livros de Kama Sutra, livros de Sexo Tântrico, filmes eróticos, games eróticos, tutoriais na internet, putas tutoras, psicoterapia individual e de casais, e um universo de outros recursos pra que você pare de culpar as putas pelo seu insucesso na cama e comece a fazer dar certo;
5) Os principais responsáveis pelo sofrimento dessas famílias somos nós. Voltando ao caso da minha pequena paciente hipotética, vocês acham que a maior fonte de sofrimento dela reside no fato de a mãe sair de casa para trabalhar toda noite, como muitos trabalhadores do distrito, ou porque nunca teve coleguinhas de sua idade nas suas festas de aniversário? Pois apesar de a mãe entregar ano a ano convites às mães de TODOS os coleguinhas, NENHUM deles aparece. :/

Pra finalizar, eu gostaria que todos tivessem em mente o romance a cujo desfecho assistimos semana passada na Rede Globo. Quantos de nós casaríamos com a Morena? Ainda que soubéssemos que ela virou prostituta contra a sua vontade... Você estaria disposto (a) a bancar frente à sociedade o fato de que a mulher da sua vida é uma "ex mulher da vida"?

Tudo isso tem a ver com estereótipos, tudo isso tem a ver com preconceitos, tudo isso tem a ver com tabus.
Até semana que vem. :)

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Agora um acróstico...

Tema intrigante
Apinhado de
Bloqueios sociais em um
Universo estigmatizante

Creio que este pequeno acróstico já seja quase que suficiente para demonstrar minhas intenções com este blog. Sou psicóloga e tanto no consultório quando no dia a dia, com um olhar científico, observo que os tabus estão no cerne do sofrimento humano.
Tabus nada mais são que determinanções impostas pela vida em sociedade, determinações estas embasadas em aspectos culturais como a religião.
A religião é a maior fonte de tabus, uma vez que surgiu em meio ao caos e à barbárie, a fim de organizar e padronizar aspectos morais e comportamentais das interações sociais.
Para as religiões, em geral, existe uma receita para se alcançar a felicidade eterna, mas o meu objetivo aqui não é de discutir Religião, posto que "Fé é algo indiscutível, mas todo mundo tem que ter.". Ops... acho que isso faz da Fé um tabu. Por mais polêmico que este assunto seja, acho que não vamos escapar de discutí-lo, assim como teremos a oportunidade de discutir outros tantos assuntos polêmicos, como sexo e família.

Tabus são polêmicos em essência.

Este blog é, portanto, um convite à discussão de assuntos sobre os quais, em geral, não podemos conversar abertamente... assuntos que fazem silenciar, que geram rótulos, causam sofrimento e adoecimento.
Preparem-se para um papo leve e descontraído, algumas vezes um pouco chocante... sem citações de autores.
Preparem-se pra embarcar rumo à reflexão e ao crescimento, à compreensão dos outros e das suas necessidades, à compreensão de si mesmos e das suas necessidades.
Serão posts semanais sobre assuntos que estejam em voga na mídia, ou no meu/nosso cotidiano, o que permitirá que todos acompanhem e que eu também me organize para não faltar com este compromisso.
Sugestões e críticas serão aceitas e muito bem vindas por e-mail, entretanto, peço que as discussões se desenrolem nos comentários, para que possamos todos construir juntos.

Vai ser um sucesso! Vem, gente! :D